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Regra técnica: o cuidado da Justiça para evitar dupla punição no homicídio culposo

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A falta de submissão do profissional às regras técnicas exigidas para o exercício do seu ofício pode custar a vida de alguém. O Código Penal (CP) estabelece que a pena para o crime de homicídio culposo é majorada em um terço se o ato que deu causa à morte da vítima foi praticado com inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício (artigo 121, parágrafo 4°, primeira parte).

Segundo a ministra Laurita Vaz, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o homicídio culposo se caracteriza com a imprudência, negligência ou imperícia do agente, “modalidades da culpa que não se confundem com a inobservância de regra técnica da profissão, causa especial de aumento de pena que se situa no campo da culpabilidade, por conta do grau de reprovabilidade da conduta concretamente praticada” (HC 94.973).

Especificamente sobre a imperícia, o ministro Arnaldo Esteves Lima, da Primeira Turma do STJ, ressalta que ela não pode ser confundida com a inobservância de regra técnica de profissão, “pois naquela o agente não detém conhecimentos técnicos, ao passo que nesta o agente os possui, mas deixa de empregá-los” (HC 17.530).

Dever de cuidado

De acordo com o jurista Heleno Cláudio Fragoso, a causa de aumento de pena prevista no artigo 121, parágrafo 4º, do CP é aplicável apenas ao profissional, “pois somente em tal caso se acresce a medida do dever de cuidado e a reprovabilidade da falta de atenção, diligência ou cautela exigíveis” (Lições de Direito Penal – Parte Especial).

Para melhor entendimento, Fragoso menciona uma situação hipotética: “Se alguém constrói um muro divisório de seu terreno e se tal muro vem a ruir causando a morte, por ter sido edificado com a inobservância de regras técnicas, parece evidente que uma culpa agravada só poderia ter um técnico na construção de muros”.

Isso porque, segundo o jurista, se o muro for construído por um profissional, com inobservância dos deveres de seu ofício, “a censurabilidade será bem maior, porque o profissional está adstrito a mais graves responsabilidades”.

Bis in idem

Há casos em que o juiz aplica o aumento de um terço pela inobservância de regra técnica de profissão, mesmo quando esta circunstância já fora considerada para a fixação da pena-base. Nessas hipóteses, configura-se o bis in idem (quando há mais de uma condenação pelo mesmo fato).

No julgamento do RHC 22.557, o desembargador convocado Haroldo Rodrigues afirmou que, “embora a causa de aumento de pena referente à inobservância de regra técnica de profissão se situe no campo da culpabilidade, demonstrando que o comportamento do agente merece uma maior censurabilidade, não se pode utilizar do mesmo fato para, a um só tempo, tipificar a conduta e, ainda, fazer incidir o aumento de pena”.

O recurso em habeas corpus foi impetrado em favor de um engenheiro civil, denunciado como incurso no artigo 121, parágrafos 3º e 4º, do CP, devido à morte de um homem soterrado enquanto trabalhava no interior de uma vala. O profissional foi contratado pela Sociedade Torre de Vigia, localizada em Cesário Lange (SP), para a colocação de tubulação de escoamento de águas pluviais. Consta na denúncia que ele não observou as regras de segurança instituídas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, o que causou o desabamento das paredes da escavação.

Ação típica

Ao analisar o recurso, o desembargador Haroldo Rodrigues, relator, constatou que a denúncia “em momento algum esclarece em que consistiu a causa de aumento de pena, apenas se referindo à inobservância de regra técnica como a própria circunstância caracterizadora da negligência do agente, fazendo de sua ação, uma ação típica”.

O relator se baseou em precedentes do STJ para dar provimento ao recurso e excluir a causa de aumento de pena da imputação.

Gás carbônico

Em agosto de 2013, a Sexta Turma analisou o caso em que uma auxiliar de enfermagem da Real e Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência do Rio de Janeiro foi denunciada, juntamente com duas técnicas de enfermagem, após uma paciente ter falecido por intoxicação (HC 167.804).

Uma das técnicas pediu ajuda ao segurança do hospital para que este efetuasse a troca de um cilindro de oxigênio vazio por um cheio, utilizado para o tratamento da paciente. Contudo, o segurança pegou o cilindro de gás carbônico equivocadamente. Quando a auxiliar de enfermagem assumiu o plantão na manhã seguinte, ela tentou nebulizar a paciente, sem perceber que o cilindro estava trocado.

No final da tarde, foi substituída por uma técnica de enfermagem, que procedeu da mesma forma, mas diante da reação negativa da paciente, interrompeu a medicação – tarde demais.

Ampla defesa

No habeas corpus impetrado perante o STJ, a defesa pediu que fosse declarada a inépcia da denúncia oferecida pelo Ministério Público (MP), que, segundo ela, não descreveu detalhadamente a conduta delituosa, impossibilitando o exercício da ampla defesa. Subsidiariamente, pediu o afastamento da causa de aumento de pena por inobservância de regra técnica da profissão.

O ministro Sebastião Reis Júnior, relator do habeas corpus, verificou que a conduta da auxiliar que teria ocasionado o falecimento da vítima foi devidamente descrita na denúncia. Em relação à causa de aumento de pena, ele mencionou que o MP restringiu-se a afirmar que, por inobservância de regra técnica nos cuidados dispensados à vítima, a auxiliar e as técnicas causaram lesões que provocaram sua morte.

Para o relator, ficou configurado o bis in idem. “Não houve, portanto, o devido esclarecimento do que configurou a majorante, evidenciando que a própria inobservância de regra técnica foi utilizada para caracterizar a imperícia”.

Diante disso, a Sexta Turma, em decisão unânime, excluiu a causa de aumento de pena e possibilitou o oferecimento de proposta de suspensão condicional do processo.

Trabalho de parto

Em abril de 2013, os ministros da Quinta Turma divergiram ao julgar o habeas corpus de médico obstetra responsabilizado pela morte de um feto. A maioria dos ministros entendeu que o aumento de pena deveria ser mantido, pois, em seu entendimento, não ficou configurado o bis in idem (HC 181.847).

O médico foi condenado por homicídio culposo, agravado pela inobservância de regra técnica de profissão, porque não esteve presente no decorrer do trabalho de parto da paciente. Com isso, deixou de diagnosticar a necessidade de intervenção cirúrgica que poderia evitar o descolamento prematuro da placenta da gestante e, consequentemente, a morte do feto.

A defesa pretendia afastar a causa de aumento, sob o argumento de que houve bis in idem, pois a negligência atribuída ao médico teria sido duplamente valorada.

Voto vencido

O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, votou pelo reconhecimento do bis in idem e foi acompanhado pelo ministro Jorge Mussi. “Se o componente da culpabilidade não excede o que regularmente se requer para a configuração do crime culposo, o reconhecimento da causa de aumento significa uma dupla valoração inadmissível”, afirmou Bellizze.

Para ele, a circunstância de aumento de pena só poderia ser aplicada com a indicação clara de qual regra técnica não fora observada pelo profissional, “exigindo-se da sentença condenatória a descrição precisa do fato correspondente à imprudência, negligência ou imperícia, bem assim do dado que indique a inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício”.

Contrariando o entendimento do relator, a Turma acompanhou o voto proferido pelo desembargador convocado Campos Marques, para quem não houve bis in idem.

“O legislador, ao estabelecer a circunstância de especial aumento de pena, pretendeu impor uma maior reprovabilidade na conduta do profissional que, ao agir de forma culposa, o fez com inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício”, declarou o desembargador.

Home care

A incidência da causa especial de aumento prevista no artigo 121, parágrafo 4º, do CP deve estar fundamentada em fato diferente daquele que compõe o próprio tipo culposo. Com esse entendimento, a Sexta Turma deu provimento a recurso em habeas corpus impetrado em favor de uma técnica de enfermagem que prestava serviço de home care a uma mulher de 84 anos (RHC 26.414).

De acordo com a denúncia, a técnica de enfermagem deixou de observar seu dever de cuidado e de evitar dano que lhe era previsível, “dando assim causa às lesões corporais que foram a causa da morte da vítima”.

Enquanto dava banho na idosa, ela permitiu que a bomba infusora de alimentação caísse na cabeça da vítima, o que provocou traumatismo craniano-encefálico com hematoma subdural e edema cerebral.

Assistente de acusação

A denúncia foi recebida e a filha da vítima habilitou-se no processo como assistente de acusação. Ela requereu um aditamento para incluir a causa especial de aumento do parágrafo 4º do artigo 121 do CP, com objetivo de inviabilizar a suspensão condicional do processo.

No STJ, a defesa questionou a inclusão da majorante, pois estaria colocada em flagrante bis in idem. Para ela, não havia a descrição de nenhum fato diferente da própria ação culposa (típica).

Para a ministra Maria Thereza de Assis Moura, relatora do recurso, houve bis in idem, pois, no aditamento à denúncia, o MP limitou-se a afirmar que não foi observada regra técnica da profissão, sem especificar de forma clara e precisa o que teria dado causa ao aumento de pena.

“O só fato de ser técnica de enfermagem, conforme posto no aditamento, não é suficiente para viabilizar a incidência da causa especial de aumento, pois seria a própria culpa”, ressaltou a ministra.

FONTE: STJ

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Alvará de folha corrida gratuito direto do site do TJRS

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A partir de agora para obter alvarás de folha corrida não é mais necessário se deslocar até a sede do Foro. Já é possível obter Alvará de Folha Corrida no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

A emissão da negativa ocorre quando inexistir condenação criminal com trânsito em julgado e pena ativa. Para ter acesso às informações, o interessado deve preencher os seguintes dados: nome do consultado e de sua mãe, data de nascimento e número da identidade. O fornecimento é gratuito.

No mesmo endereço eletrônico também pode ser verificada a autenticidade do Alvará de Folha Corrida emitido pelo Tribunal de Justiça, informando o código de controle impresso no documento a cada consulta. A aceitação do alvará está condicionada à conferência dos dados da parte interessada contra aqueles constantes no seu documento de identificação.

O alvará de folha corrida é expedido de acordo com os registros dos sistemas de Informática do Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul, observada a disposição do inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal. A emissão considera os registros consolidados até a data anterior a sua geração.

Emissão imediata

Após preencher os dados solicitados no formulário disponível no site, a declaração pode ser impressa de forma imediata.

Para requisitar o alvará no Foro, é preciso pagar uma taxa de R$ 3,60. Somente no Foro Central da Capital, são fornecidos em média 250 alvarás de folha corrida por dia.

Clique aqui e consulte gratuitamente o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

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Carteiro será indenizado por invalidez após carregar malotes por 23 anos

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Um carteiro que ficou incapacitado para o trabalho depois de carregar malotes com correspondências de 25 quilos por 23 anos receberá R$ 500 mil de indenização por danos materiais e outros R$ 80 mil por danos morais. A decisão foi tomada pela Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho.

O carteiro trabalhou para a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) de maio de 1978 a abril de 2006. Na etapa inicial do contrato, carregava caminhões manuseando de 100 a 120 malotes de cartas por dia. Depois, ao ser transferido para o aeroporto de Salvador, passou a carregar malotes mais pesados, de 35 quilos. Em 1999, o corpo do trabalhador envergou ao erguer um malote e ele caiu da escada, tendo sido diagnosticado com doença ocupacional e afastado do serviço.

Quando voltou ao trabalho, ao invés de ser alocado em outra função, continuou fazendo o carregamento de malotes e em 2001 acabou afastado definitivamente por invalidez. Por entender que a empresa o expôs a riscos ergonômicos e a esforço anormal por longos períodos, o carteiro foi à Justiça pleitear indenização por danos morais e materiais.

A ECT se defendeu afirmando que a doença do trabalhador provavelmente tinha como origem fatores hereditários e pré-disposição genética, inexistindo nexo causal entre os problemas na coluna e LER e a atividade de carteiro.

Indenização

Ao examinar o caso, a 13ª Vara do Trabalho de Salvador (BA) determinou que a empresa pagasse ao carteiro R$ 100 mil a título de indenização por danos morais e R$ 148 mil em danos materiais, a ser paga de uma vez, além de valores de FGTS.

A empresa recorreu da decisão, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região deu provimento ao pleito para absolvê-la da condenação por danos morais por entender que não havia prova concreta do abalo moral sofrido. Já quanto aos danos materiais, o Regional deu parcial provimento ao recurso para reduzir à metade o valor da indenização (R$ 74 mil).

O carteiro recorreu e o desfecho no TST foi outro. Quanto aos danos morais, a Segunda Turma entendeu que estes são presumíveis, sendo desnecessária prova capaz de mostrar o abalo no trabalhador decorrente da restrição da capacidade laboral. Por essa razão, a Turma deu provimento ao recurso e fixou a condenação em R$ 80 mil a título de danos morais.

Quanto aos danos materiais, a Turma afirmou que, se o ato danoso ocasionou a perda da capacidade de trabalho, a indenização deve corresponder ao valor que o empregado deixou de receber caso estivesse em atividade. Com base no voto do ministro José Roberto Pimenta, a Turma deu provimento ao recurso do carteiro para deferir o pagamento de R$ 500 mil de indenização por danos materiais.

FONTE: TST

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Saiba como preencher um cheque de forma segura

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como preencher um chequeComo ninguém nasce sabendo e muito banco por aí não dá a mínima para o correntista, neste breve artigo trataremos das formas mais adequadas para se emitir um cheque com segurança. Para isso precisamos entender os tipos de emissão.

Ao portador – O cheque só pode ser emitido ao portador (sem a indicação do beneficiário) até o valor máximo de R$ 100,00. Quando ultrapassado este valor o cheque obrigatóriamente deve conter a indicação do beneficiário.

Nominal – A partir de R$ 100,00, o emitente é obrigado a indicar o nome do beneficiário (pessoa ou empresa a quem está efetuando o pagamento). O cheque nominal só poderá ser pago pelo banco mediante identificação do beneficiário ou de pessoa por ele indicada no verso do cheque (endosso), ou ainda através do sistema de compensação, caso seja depositado.

Nominal não à ordem – Que é aquele que não pode ser endossado (transferido) pelo beneficiário.
Para tornar um cheque não-à ordem, basta o emitente escrever, após o nome do beneficiário, a expressão “não-à ordem”, ou “não-transferível”, ou “proibido o endosso” ou outra equivalente.

Cruzado – Tanto o cheque ao portador quanto o nominal podem ser cruzados, com a colocação de dois traços paralelos, em sentido diagonal, na frente do documento. Nesse caso, só será pago através de depósito em conta corrente.

Administrativo – É o cheque emitido pelo próprio banco. Pode ser comprado pelo cliente em qualquer agência bancária. O banco o emite em nome de quem o cliente efetuará o pagamento.

Especial – Assim denominado porque o banco concedeu ao titular da conta um limite de crédito, para saque quando não dispuser de fundos. O cheque especial é concedido ao cliente mediante contrato firmado previamente.

Considerando as informações acima fica mais fácil do emitente decidir que tipo de cheque e qual o nível de segurança/restrição quer aplicar ao título. Quanto menos se conhece a pessoa que receberá o cheque maior deve ser a segurança do cheque, uma vez que este é uma ordem de pagamento a vista e o beneficiário poderá fazer o que quiser e dar a quem bem entender no caso de cheque ao portador.

É importante tomar alguns cuidados com o cheque pré-datado. Pela lei, um cheque é pagável quando for apresentado ao banco, pois este é uma ordem de pagamento à vista, e não o deixa de ser mesmo que tenha sido emitido com data posterior. Assim, se um cheque pré-datado for apresentado para pagamento antes do dia previsto, o banco terá de pagá-lo ou devolvê-lo por falta de fundos. Caso isso ocorra, o correntista poderá ser prejudicado.

Entretanto na esfera judicial há grande corrente que entende que o cheque pré-datado adquiriu força jurídica pelo seu uso em larga escala. Esse entendimento só tem efeito na esfera judicial, ou seja, o banco pagará mesmo assim o cheque, contudo poderá ser questionado posteriormente em via judicial.

E por fim, não menos importante, vale lembrar que o cheque prescreve 180 dias depois de sua apresentação, que deverá ser feita em 30 dias.

Com estas informações quando você for emitir um cheque, ficará mais fácil decidir de que forma o emitirá, isto influenciará diretamente na segurança do título e poderá evitar transtornos futuros.

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